Diário dos Olhares Entrecruzados

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OS OLHARES SÃO como janelas para um universo complexo e indecifrável. Eles vivem caçando outros que aceitem suas estranhezas sem preconceito ou constrangimento. Na maioria das vezes, porém, está a fugir dos encontros, temendo que descubram seus segredos.
  Nesse vai-e-vem de olhares perdidos, de mentes desconectadas, sem nenhum vínculo, insolidárias, acontece de alguns desses olhos se encontrarem. Nesses curtos instantes - não mais do que alguns segundos -  simplesmente não sabemos o que fazer. 
   A princípio, a vontade é fugir. Escapar à análise do outro. Um frio intenso bate sobre o corpo, paralisando-o. Mas pode acontecer de que uma certa energia se forme entre esses olhos, gerando um campo de atração, não de repulsão. 
   Os olhares se fixam e tentam, sem palavras, dizer uma infinidade de coisas. A adrenalidade faz o coração acelerar. Perdemos o chão. Escapar àquele olhar seria uma falta de humanidade ou o fim de uma faísca de uma oportunidade. Não sabemos se acreditamos ou se estamos nos iludindo.
   Os segundos passam e os olhares se perdem no meio de tantos outros, frios e carentes. Porém, acontece de eles desejarem se encontrar de novo. E assim vão, entre cotovelos, antebraços e cabeças, caçando um ao outro.
   Não sabem o que esperar dessa busca. Não há tempo para imaginar, refletir, deliberar. Eles apenas se cruzam. As palavras faltam. As ideias somem. Só o que resta é apreciar o universo brilhante na vista de um olhar estranho.
   O tempo se passa e os olhares vão, indecisos, tentando se descobrir. Mas a vontade sucumbe ao medo, medo de mais uma desilusão. Medo de uma amizade que não existe, de um amor num mundo frio, de um elogio sentido como cantada, de um amigo que possa virar carrasco. Por desse emaranhado de incertezas que eles vão se afastando, decaindo.
   E, de repente, a parada de um deles chega. Um adeus desesperado, carregado de esperanças e sonhos é transmitido pelo ar, sem pronunciar um fonema sequer. O que resta são suposições, conjecturas, reflexões. E desses vários 'talvez' a vida vai seguindo - de parada em parada - seu imprevisível rumo.



De Alexandre Valério Ferreira


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