Diário do Mictório

Foto: http://blog.meber.com.br/ja-pensou-em-ter-um-mictorio-no-seu-banheiro/

Por Alexandre Valério Ferreira


ERA UMA VEZ quatro mictórios. Eles habitavam um típico banheiro masculino. Havia apenas um vaso sanitário, o qual nunca estava em funcionamento. Apesar disso, era sempre o mais procurado pelos humanos.
   Um senhor quarentão que usava pochete entrou correndo. Era evidente sua agonia urinaria. De imediato, foi caçando o vaso sanitário. Mas este, através de uma porta trancada, conseguiu trazer uma enorme agonia ao infeliz ser dos anos 70. O senhor foi então para o mictório do canto.
   No mesmo instante, chega um rapaz com cara de roqueiro. Estava todo de preto, apesar do calor cearense. Possuía cabelos compridos e bem cuidados. Usava uma mochica com inúmeros bottons. Ele também sentia uma enorme vontade de liberar a substância amarela. Seguiu o ritual de sempre: vaso sanitário, porta trancada, mictório.
   A chegada desse rapaz causou uma forte inibição urinário no quarentão. O roqueiro sente uma energia que lhe expulsa das proximidades do senhor e ele vai para o mictório mais distante. Quando ele ia começar o processo de expurgo do líquido, chega uma outra pessoa.
  Era um homem de bigode. Parecia jovem, porém, os pelos sob o nariz lhe envelhecia alguns anos. Ele percebeu o constrangimento dos outros colegas de banheiro. Ainda assim, seu corpo lhe alertou que tinha de urinar naquele momento.
   Tudo seria muito simples, se não fosse o fato de haver outras pessoas utilizando o mictório ao mesmo tempo. Qual aparelho escolher? Qualquer um deixaria um em situação constrangedora, enquanto aliviaria o outro. E independente da decisão, o rapaz de bigode ficaria desconfortável.
   O do bigode escolhe ficar perto do senhor de 40 anos. Ele aproxima-se do mictório, abre o zíper e espera. Espera. Espera. Nada. A urina não desce! E agora? Parecia até que tinha incontinência urinária ou algo do tipo. Fica constrangido. Para disfarçar naturalidade, começa a assoviar.
   O senhor dos anos 70 também não consegue tirar a água do joelho. E, por mais que tente, o líquido não sai do corpo. Estava trancafiado nas profundezas da sua bexiga. Tenta com pouco sucesso fingir naturalidade e fala consigo mesmo sobre um assunto qualquer.
   Não menos intimidado ficou o roqueiro. Mesmo em uma distância razoavelmente maior, sentia-se constrangido. Ele tenta fingir que está acabando de urinar. O mesmo fazem os outros dois gradualmente. Apertam a descarga e fecham o zíper como se tudo tivesse dado certo.
   Lavam as mãos lentamente. Talvez à espera de por fim ficar sozinho com o bendito mictório. Porém, o processo em paralelo impedia o utópico momento de êxtase urinária. Assim, os três saem do banheiro apertados, com persistente dor na bexiga, infelizes para sempre (ou pelo menos até encontrem outro banheiro mais vago).

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